Back to USA. Oregon, a Borgonha na América
Oregon. Montanhas e vales, bosques, uma paisagem sempre elegante e verde a dominar, que se torna mais grave e agreste quando olhamos as impressionantes montanhas (Cascades) e deixamos o Pacífico nas costas. Estamos no Paralelo 45, em linha com uma das mais famosas regiões vitivinícolas do mundo, a Borgonha. Isto promete!
Estou com o meu amigo Miguel Charters, que acompanho num novo e incrível projeto na região de Melides (mas sobre isso falarei mais tarde). Não há nada como viajar, o ir à procura de novas experiências, novas pessoas, novo conhecimento. Fico sempre com aquele entusiasmo nervosinho antes de embarcar. Desta vez sigo para a costa oeste dos Estados Unidos, sim, de volta aos USA e onde tinha estado a trabalhar em 2003, a Califórnia, mas agora também com tempo para um pequeno salto ao Oregon, este estado incrível, onde a produção de vinhos é uma referência.
Dentro do Estado destacam-se cinco grandes regiões: Portland, Walla Walla, Columbia Gorge, Umpqua Valley, Rogue Valley e claro o Willamette Valley. Não há tempo para visitar todas, por isso o foco é o Willamette, o coração dos vinhos do Oregon e onde encontramos os projectos mais interessantes. O Willamette Valley é ladeado pelo Oceano Pacífico a Oeste e pela tal cordilheira das Cascades a Este. Pelo meio segue o Rio Willamette, que vai rasgando uma paisagem em que as vinhas estão sempre ladeadas ou escondidas por grandes bosques de árvores, principalmente a Douglas Fir (ou Pseudotsuga para nós). um pouco à imagem nosso Dão, embora nós seja mais… eucaliptos.
Cameron Wines
Estamos no início de Maio e as vinhas ainda estão a abrolhar! Como assim? Em Portugal já temos a vinhas na fase da floração! Chegamos à primeira visita e logo outra surpresa, vemos troncos enormes, vinha velha – tem muito que se lhe diga este Novo Mundo, com vinhas velhas desta categoria. Estou a gostar! Há, no entanto, um detalhe. A geada queimou os rebentamentos e a produção está hipotecada. “Sad isn’t it?”. John Paul, enólogo da Cameron Wines, primeira casa que visitamos, diz-nos com um ar infeliz que nesta vinha a produção é para esquecer. O que vemos são apenas rebentamentos secundários, menos produtivos. Trágico.
Os viticultores entregam-se de alma e coração às suas vinhas, mas estão sempre nas mãos do acaso. O John diz-me que nunca tinha visto nada assim, ele que plantou a primeira vinha ali mesmo, em 1977. A Cameron Wines está sub-região de Dundee Hills e John Paul e Bill Wayne, o seu sócio, são pioneiros da viticultura por aqui. Têm algumas das plantações mais antigas , vinhas lindas com troncos enormes carregados de história. Fazem seleção massal, recuperam a vinha com estacas destas mesmas videiras, no início originárias de clones da Borgonha – porque é assim que se salvaguarda a complexidade e singularidade do que aqui evolui.
Ah, e claro, são uns apaixonados pelas referências da Borgonha, e isso vê-se também na adega, um misto entre os USA e a região francesa. Por fora é um edifício clássico americano, construção em madeira em tons azulados, por dentro, uma cave onde as barricas estagiam. E os vinhos também a seguirem aquele perfil francês, o Chardonnay tenso, vibrante e super fresco, o Pinot pura sedução, finesse, classe absoluta. Que grandes vinhos John! Saímos da prova e vamos conhecer mais umas parcelas de vinha, guiados pelo Bill, um daqueles viticultores que nos guiam com um discurso carregado de paixão. Que grande experiência! Obrigado. E que grandes vinhos!
Domaine Serene
Pinot Noir e Chardonnay! Os americanos são os reis da experimentação de castas, mas este Oregon inspirado pela Burgundy é um hino a estas duas castas. Seguimos para o Domaine Serene, também ainda em Dundee Hills, no mesmo Willamette Valley, para irmos ao encontro de um dos produtores mais icónicos desta região. Vemos nomes clássicos da Borgonha a investir aqui, como as casas Drouhin e Jadot, mas também o inverso: a Domaine Serene foi até à Borgonha e comprou uma casa na região, o Chateau de la Crée. É obra!
Por aí se vê a dimensão deste Domaine Serene. Uma adega nova, um visitor center já mesmo à americana, show bizz puro! A adega é irrepreensível, feita com detalhe e rigor, um templo de celebração ao Pinot, sim, porque estamos no reino do Pinot, pela imensa quantidade de cubas de fermentação “open tops”, cubas clássicas para fermentação desta variedade, em que as remontagens são feitas por um pisador mecânico de uma forma suave, para uma extração mais controlada. Depois, um parque de 13.000 barricas, um sonho para qualquer enólogo! Vamos à prova e sentimos o mesmo rigor nos vinhos. Talvez aqui com um perfil mais americano, com a madeira a marcar um pouco mais o conjunto. Terminamos com um Pinot feito só para o clube. Enfim, o que dizer… um tinto de classe mundial!
Resonance winery e o incrível Thomas
Se o primeiro dia no Oregon foi perfeito, o segundo não podia ficar atrás. Seguimos para a adega do grupo Louis Jadot, um dos nomes maiores da Borgonha. Aqui só se trabalha exclusivamente com Chardonnay e com Pinot Noir. A zona é incrível, num ponto alto de Carlton, com vistas dramáticas sobre o vale de Willamette. A sala de provas é das mais bonitas da região, envolvida por um bosque de carvalho americano. E os vinhos são fiéis à filosofia da casa mãe: tensão, mineralidade e pura expressão do terroir.
Seguiu-se um dos mais especiais produtores da região, John Thomas. Este produtor é conhecido em toda a região. É o verdadeiro “one man show”, visto que faz tudo literalmente sozinho. Nunca teve um funcionário, só recorre a contratação para fazer a vindima, que se termina num dia. Passo a explicar: são cerca de 2 ha de vinha, de onde ele tira 10.000 kg de uvas, tudo Pinot Noir. Depois faz o trabalho de adega sozinho, a recepção, as remontagens com pisa, as trasfegas, o encher e o esvaziar das barricas, o engarrafar do vinho, tratar da vinha, poda. Tudo by himself!
À beira de completar 70 anos, este é o verdadeiro vigneron do Oregon. E por entre isto tudo, é uma pessoa incrível. Com imenso conhecimento da região, e sempre com uma sinceridade extraordinária, o John abre o livro e conta tudo. Sem segredos, sem maquilhagem. Daquelas pessoas que nunca mais vamos esquecer. Tal como aquele vinho que connosco partilha, um Thomas 2002 em Magnum. Um Pinot extratosferico!
O exemplo para Portugal
No Oregon, tempo ainda para uma visita a uma amiga, a Barbara Gross. O seu pai, Robert Gross fez também parte do grupo dos pioneiros na região. Plantou a primeira vinha em 1978 (um ano bom para tudo), e hoje é uma das referências na agricultura biodinâmica e orgânica na região. Fomos recebidos de braços abertos, partilhamos uns copos de vinhos, provámos os enormes Pinot que fazem ali mesmo naquela vinha de 1978. Conversas puras, sem rodeios, de partilha de experiências e de conhecimento. É tão fácil falar com os americanos, parece que eles têm o dom de descomplicar. Conseguem trabalhar bem em conjunto, olham sempre para o bem comum – e se nós fôssemos mais assim, talvez hoje Portugal estivesse noutro patamar…
Depois do Oregon, tempo de descer até à Califórnia e continuar a viagem. O Oregon soube a pouco. É passagem obrigatória, mais demorada. Levo a vontade de voltar e um pequeno-grande orgulho: toda a gente fala de Portugal e diz que está nos planos viajar até ao nosso país. Estamos na moda, há que receber bem esta gente e divulgar o melhor possível o nosso pais.
ps: thank you so much Amy Lee for welcoming us in such a great tryp!