Vinho

2023. As 12 badaladas (do enólogo) do ano

O ano chega ao fim e tinha que deixar aqui uma, duas ou… doze badaladas sobre esta volta ao Sol que passou num instante. Oportunidade para me despedir deste 2023 em que fui distinguido com o prémio Enólogo do Ano, pela revista Grandes Escolhas, enfim, tudo uma bela justificação para partilhar e agradecer o que de bom tem acontecido e continua a acontecer. E de maneiras que se me apeteceu dizer o seguinte.


Vinho branco | Quinta do Ribeirinho Sercialinho – Luis Pato

O grande Mestre Luis Pato é uma das minhas referencias profissionais. Um grande estudioso de terroir e responsável por alguns dos melhores vinhos portugueses, com os quais tenho tido o privilégio de me cruzar aqui e ali. Com este Sercialinho, Luís Pato volta a surpreender e a mostrar que os brancos de Portugal (e da Bairrada) podem ser dos melhores do Mundo. Um vinho tão apaixonante e genuíno quanto os seus vídeos no Instagram. Único!

 

Alvito | Um novo desafio

O Alentejo ainda tem muito para dar e, no Alvito, nasce um novo projeto. Plantámos a vinha em 2017 e este ano, finalmente, lançámos a primeira pedra. A adega começa a ganhar forma e já vai acolher a vindima de 2024. Há poucas coisas mais entusiasmantes profissionalmente do que ver uma adega nascer e o projeto tomar forma. Chama-se Herdade de Mujadarem e estou cheio de vontade de lá fazer a primeira vindima.

 

 

Melides | Os detalhes contam

Por vezes temos de dar um passo atrás para dar outro maior. Ainda não tínhamos feito uma vindima e este ano tomámos a (difícil) decisão de arrancar a vinha e voltar a plantá-la. As coisas não estavam como queríamos, a ideia é fazer algo verdadeiramente especial e com muita coragem (da familia Charters, leia-se) lá se tomou a decisão de voltar a fazer tudo de novo. Uma vinha incrível está a desenhar-se nas encostas de Melides, orgânica, sem rega, a acompanhar as curvas de nível como mandam as melhores práticas de valorização do solo e da irrigação natural. O resultado final, por certo, compensará o tempo de espera e o empenho colocado no projeto.

 

 

Late Harvest | Temos Botrytis na AdegaMãe

Andei cinco vindimas a tentar chegar a este resultado, que apesar de tudo não depende só da intervenção do homem. Há aqui uma componente fundamental que só a Natureza pode garantir, o aparecimento da Botrytis cinerea, que é o que torna este vinho mesmo especial. Neste Colheita Tardia 2021 da AdegaMãe bateu mesmo tudo certo e o resultado final é um vinho equilibradíssimo entre acidez e doçura. É capaz de ser um dos vinhos para ficar na carreira. E agora… será que vamos ser capaz de repeti-lo?

 

 

Quinta dos Frades | Um sonho no Douro…

Sim, é o sonho concretizado. Já há muito que sonhava com a possibilidade de entrar neste projeto, que visitei tantas vezes com o mestre Anselmo Mendes. E agora, chegar lá e constatar de perto todo imenso potencial deixa-me ainda mais entusiasmado. A Quinta dos Frades tem uma das maiores manchas de vinha velha do Douro, parte dela centenária, enquadrada numa propriedade histórica e num cenário único. É grande a expectativa e é grande a responsabilidade – porque têm que estar grandes vinhos no horizonte! Coragem!

 

 

Viagem | O regresso a Napa e a Sonoma

Quem disse que não devemos voltar onde fomos felizes? Napa e Sonoma foram, de novo, a viagem do ano. Regressar a este sítio tão especial para mim foi algo incrível. Adoro aquele lugar, as adegas, as pessoas e o rigor e o detalhe que colocam em cada aspeto da produção. Aprendemos sempre. E regressamos com a ambição renovada de fazer com que os projetos onde participamos tenham o mesmo reconhecimento que eles alcançam. Pois. Nota mental: a Alana Vineyard da Three Sticks Wines é mesmo um sonho.

 

Touchdown | Os San Francisco 49ers em casa

Porque nem só de vinho vive o winemaker! Tenho esta grande paixão pela NFL e pelos 49ers. Foi um bichinho que ficou desde 2003, quando estagiei na Califórnia, e todos os anos sigo com dedicação a época da NFL. Este ano concretizei o sonho de os ver ao vivo no seu novíssimo estádio, o Levi Stadium. Touchdown! Ponto importante na checklist de uma vida!

 

 

Celler de Can Roca | O jantar

Templo da gastronomia mundial, já por diversas vezes considerado o melhor restaurante do mundo, o Celler de Can Roca é efectivamente um lugar emocionante. O que dizer!? É o sabor, o equilibro, a pureza, a hospitalidade, tudo ali é especial. E claro, quando estamos com uma das melhores garrafeiras do mundo, a combinação é perfeita. E agora, vamos jantar onde?

 

Vamos ao… | Taberna Albicroque e ao Seixo

Calma, há vida para além disto. Eu sempre fui um grande fã do Chef Bertílio Gomes, desde o Vírgula, Casa da Comida, Chapitô, mas a verdade é que desde a abertura não tinha ido à Taberna Albicroque. Distração absoluta, pelo que este ano recuperei o tempo perdido, e como tem valido a pena! O Bertílio é um Chef incrível, com uma criatividade que traz um respeito imenso pelo produto e fez deste restaurante um lugar obrigatório para quem gosta de comer (e beber) bem. E depois o Seixo, em plena Quinta do Seixo, coração do Douro, já quase a chegar ao Pinhão. A revolução tranquila que está a acontecer no Douro, com as quintas a investirem mais no enoturismo e a apresentarem novas soluções para os visitantes, é um verdadeiro privilégio, que se reforça quando surgem restaurantes com uma cozinha como a do Vasco Coelho Santos melhor. O forno de lenha deixa-me no céu. E aquela esplanada a ver o Douro, claro, não tem comparação!

 

Vinho tinto | Tignanello 2019

Este vinho tem tanta história, um peso familiar tão grande, com camadas e camadas de gerações de Vinattieri que há séculos e séculos cuidam as suas vinhas e a sua arte como algo inegociável, que quando nos abrem a garrafa já vamos apaixonados. Mas depois dá-se a prova e há mais, há uma espécie de regresso ao essencial, um alarme do que deve ser a elegância de um grande tinto. Sim, passam-nos tintos e tintos pelo copo ao longo do ano e, no final, ganha sempre a elegância. Uma obra prima pela casa Antinori, um vinho emocionante. Bebido sem esperar numas férias da neve em Kitzbühel, na Áustria, para torná-lo ainda mais inesquecível.

 

 

Os brancos | A consagração da idade

Sim, não podia fechar isto sem voltar ao tema dos brancos. Mas os brancos de idade! Aos poucos lá vou conseguindo evangelizar os amigos das maravilhas que é abrir vinhos brancos já com alguns anos em cima. E depois lá vou recebendo notícias reconfortantes de gente, deliciada, surpreendida, apaixonada – sim, entretanto vão estar a dizer-me que já bebem mais brancos do que tintos. É sempre assim. “Abri um Arinto dos anos 90”; “abri um Alvarinho de 2000”. A mensagem está a passar e fico muito feliz com isso, sobretudo porque há todo um novo campo de opções e experiências por descobrir. Que venham os brancos com idade!

 

Olá prémio Enólogo do ano | E adeus

E para acabar, 2023 vai consagrar um novo Enólogo do Ano, que é como quem diz que vou retirar o prémio do carro e deixar de andar a partilhá-lo com as equipas onde faço vinho. Ou então fica lá para sempre, que um tipo nunca sabe quando é que isto acontece novamente. Agora a sério: a Grandes Escolhas chamou-me ao palco em março e eu lá fui envergonhado, meio sem jeito, tentar dizer alguma coisa que fizesse justiça com toda a gente que me tem ajudado e inspirado nesta vida. Este ano não vou ser Enólogo do Ano, mas as pessoas e os projetos estão lá, a tornar esta vida um privilégio constante. E esta palavra vou renová-la sempre: obrigado!

 

Bom Ano para todos!