Mosel. É ir e descomplicar uma das melhores regiões do mundo

Mosel. Aquela região alemã que se define pelo rio com o mesmo nome, conhecida sobretudo pelos Rieslings incríveis, e pelas garrafas e rótulos estranhos com uma terminologia germânica que achamos que nunca vamos compreender; e pelas diversas categorias de doçura, tudo uma complexidade que nos leva a arrumar o Mosel na prateleira do esquecimento, apenas como… aquela região alemã marcada com o rio com o mesmo nome. Errado. Não há que ficar intimidado. O Mosel não só é fácil de ir como, afinal, até é fácil de descomplicar. E depois é um festival de vinhos sempre incríveis, longevos, tensos, que raramente desiludem.
Ainda por cima, para ajudar a quebrar o bloqueio da ida ao Mosel, tínhamos o ponta-de-lança Miguel Louro, um enólogo de sangue alentejano (Quinta do Mouro) a viver e trabalhar na região desde 2016, preparado nos abrir as portas de alguns dos melhores produtores. E que, para começo de conversa, nos levou logo a uma das mais famosas vinhas da região e do mundo, a vinha Scharzhofberg de Egon Müller, uma fantástica encosta de Riesling onde se fazem alguns dos mais raros e cobiçados vinhos do planeta… A viagem, que começou logo a prometer, foi rapidamente simplificada.

Descodificação dos vinhos Riesling:
- Vinhos secos (os Trocken)
Normalmente os melhores levam a classificação de GG (Grosses Gewächs), uma espécie de Grand Cru, identificando sempre o nome da vinha que lhe dá origem. Também podemos ter os 1G (Erste Lage), que não são mais do que um Premier Cru, também identificando o nome da vinha que lhe dá origem. Ou seja, como nas grandes regiões do mundo, o que manda é a origem da uva. E, claro, há locais/vinhos mais especiais do que outros.
- Vinhos doces (os Restüsse)
Ao contrário do que pensava, as grandes estrelas da região. Neste fantástico mundo, o jogo da doçura final está relacionada com a exposição das vinhas (os vinhos doces são sempre provenientes de vinhas mais expostas) e com as maturações na hora da colheita. Na vindima escolhem-se cachos de acordo com o avançar da maturação. E assim se fazem as classificações de Kabinett, Spätlese, Auslese, Beerenauslese e Trockenbeerenauslese. Parece complicado mas até é relativamente simples: cachos com alguma maturação fazem o Kabinett, que será um vinho com mais frescura e doçura por volta dos 30/40 g (pode variar de produtor para produtor); os Trockenbeerenauslese já são puros colheitas tardias, feitos com bagos completamente desidratados.

Feito o enquadramento, vamos então às visitas e provas. A primeira experiência foi na adega onde o Miguel Louro é o enólogo responsável, a Willems-Willems. Aqui as estrelas são os vinhos secos, os Trocken, e deu para provarmos e vermos bem as diferenças entre as diferentes vinhas e suas exposições: Herrenberg, Altenberg. Este domínio fica na sub-região do SAAR, uma zona onde os rios Saar e Mosel confluem. Terminamos ainda com os Kabinett e com os Spätlese, vinhos com uma elegância extrema. A doçura está sempre mascarada por uma fantástica acidez. Irresistíveis.
Ao segundo dia, ida a um dos grandes nomes da região, Markus Molitor. Com umas instalações fantásticas, bem preparadas para receber os turistas e com muitas ferramentas explicativas para descodificar a complexidade dos Riesling. Uma vez mais a viagem é conduzida em função dos locais das vinhas, sempre com o Terroir a definir o caminho. E, claro, terminamos nas vinhas de melhor maturação, com os Kabinett e restantes. Incrível!!
Entre as visitas, a viagem pelo vale do Mosel é sempre impressionante, graças à paisagem de vinha de encosta debruçada para o rio. A fazer lembrar uma outra que bem nos é familiar, o Douro, com uma grande diferença; aqui não se fazem os socalcos e patamares, é tudo em vinha ao alto, ideal para quem não tem vertigens e gosta de alpinismo!!
Seguiu-se a visita Joh. Jos. Prüm. Que grande prova, num produtor extraordinário onde só se fazem vinhos de Kabinett para cima, ou seja, sempre com maturação (e atenção, nunca se diz vinhos doces, vamos aprendendo ao longo da visita).
Mais um dia, nova visita, agora ao Maximin Grünhaus, uma adega histórica com referências deste o tempo dos romanos. Onde levamos uma enorme lição de história da região. Os vinhos são incríveis, cheios de tensão e caracter. Aqui tivemos vinhos GG de vinhas especiais como a Herrenberg e vinhos Kabinett e Spätlese incríveis. E à medida que os dias foram passando, o encanto foi cada vez maior com este tipo de vinhos, normalmente de baixa graduação (8 ou 9% de álcool), mas sempre soberbos na sua complexidade.
Por fim, visita ao Weingut Peter Lauer. Um primado da acidez e da tensão. Vinhos que prometem durar para sempre, a lembrarem o lado verdadeiramente diferenciador dos Riesling. Um fecho épico, numa jornada também a visitar uma série de bons restaurantes na região, sempre a partir da nossa sede, Trier, uma das cidades mais antigas da Alemanha, cheia de história e de recantos incríveis. Deixo a dica do nosso último jantar, um festival no restaurante Schloss Monaise, bem próximo do rio. Grande garrafeira regional, uma gastronomia de alto nível e para finalizar, claro, um Spätlese. Não vejo melhor forma de terminar uma refeição!!