Vital. O tesouro que nasce na Serra de Montejunto
Depois de Vilar é sempre a subir. O alcatrão começa a ficar cada vez mais estreito e à medida que travessamos as aldeias de Avenal e Pereiro, sucedem-se aqueles ganchos que permitem à carrinha dobrar a serra. Estamos a galgar Montejunto e é precisamente em Pereiro que apontamos a um caminho de terra batida e ao que vamos: uma vinha. Esta é a encosta poente da Serra de Montejunto. Existem uns pinheiros por aí acima, inclinados pelas nortadas, até à estrada que atravessa o maciço e nos leva depois ao topo, ao Areeiro e ao Quartel; estamos bem expostos ao vento que nos chega do mar – as rajadas de noroeste costumam batem forte por aqui – mas estas videiras velhas, 40 anos e mais, aguentam-se, teimam em resistir, mesmo sem armação. A casta? Uma verdadeira relíquia: Vital!
Já tinha ouvido falar nas vinhas Vital, originais aqui de Montejunto, hoje uma verdadeira raridade que se diz sobreviver nuns curtos 20 hectares. Algumas das adegas emblemáticas desta zona fizeram, e algumas ainda fazem, vinhos excelentes com esta casta. Mas ao longo das décadas, contudo, o cultivo do Vital foi progressivamente abandonado, por se tratar de uma casta difícil, vulnerável à humidade e às doenças e, portanto, de qualidade e produtividade muito irregular. A questão é que o oposto também é possível. Há uns tempos, aliás, provei um Vital sublime, do Casal Figueira, um branco velho, cheio de notas misteriosas, mas muito mineral e fresco. Estamos a falar daqueles vinhos brancos que se revelam extraordinários com os anos e mais anos em garrafa. E agora, graças a um bom amigo da AdegaMãe, o Licínio, entusiasta dos vinhos brancos de Lisboa, tive finalmente a oportunidade de ir à descoberta destas uvas.
Cá estamos, portanto, nesta vinha que sobe Montejunto. É nesta autêntica revelação que conhecemos o sr. Delfim, agricultor, proprietário destas videiras imaculadas. Aqui, o seu Vital brilha por entre vinhas mais ou menos desprezadas. Os cachos vingaram bem e as videiras mostram pujança. Não há sinal de doenças. “Não é costume, talvez porque esta encosta em particular parece menos exposta a humidades”, diz. Às brisas que chegam do Atlântico junta-se o terreno argilo-calcário. As pedras acumulam-se à volta das cepas. Lisboa é esta riqueza, no clima fresco, mas também em alguns solos muito particulares. Depois temos a casta Vital, ela própria algo de único. É sabido que a região encerra um potencial enorme para os brancos, pelo terroir mas também graças à originalidade e adaptabilidade de castas, não apenas o Vital, mas também as de implantação comum, como o Arinto, o Fernão Pires ou o até o Viosinho.
A questão é que o Vital acrescenta algo ainda mais característico, não apenas por ser raro, mas pela tal evolução muito particular em garrafa. Na vindima que se avizinha, a AdegaMãe vai vinificar estas uvas fantásticas, procurando confirmar o potencial da casta, e acima de tudo honrar o grande trabalho aqui desenvolvido pelo Sr. Delfim. Sim, será uma honra. Vamos procurar contribuir para o renascer da casta vital. Mãos à obra!